Surgido em 1982 em livro publicado pela prestigiada Alice Walker (If the Present Looks Like the Past, What Does The Future Look Like?), o termo colorismo designa os diferentes tons da pele preta e como esses tons são atingidos pela exclusão ou permitem uma inclusão em meios sociais.
Se imaginarmos uma paleta de cores e nos concentrarmos nas que partem dos tons mais claros para os mais escuros, podemos nos colocar em alguma classificação do colorismo. Partindo para a vida real, nos deparamos com o quanto isso pode influenciar a vida de diversas pessoas pretas. Por exemplo: pessoas de pele mais clara têm vantagens dentro da sociedade que as de pele mais escura não têm.
É algo bem simples de ser sentido e identificado, basta lembrar de alguns termos serviram, e ainda servem, para anular a etnia e tentar camuflar nossas origens, como: morena, café com leite, marrom bombom, cor de canela, de jambo ou pecado, neguinha, entre várias outros. Tudo isso veio minando nossa cultura e iludindo a nossa autoestima.
Como falado anteriormente, o fator colorista serve também para afetar o desempenho das pessoas pretas dentro de nossa sociedade que já traz um sistema com um enorme histórico racista. Quantas são as pessoas pretas que assumem cargos elevados ou se destacam pela qualificação que têm? Se vocês responderem a essa pergunta com algo que se assemelhe a “hoje em dia temos pretos fazendo tudo”, vocês chegarão a alguma conclusão que talvez não seja satisfatória.
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), apenas 54% da população se declara preta - e isso prova que nem somos a minoria que todo mundo ainda acha que somos, mas teriam esses 54% a consciência de que dentro dessa tabela política nós estamos todos fragmentados e quase impossibilitados de compreender que há um problema seríssimo em torno dessa auto declaração? Será que uma porcentagem mais escura desses 54% já teve que competir a uma mesma vaga de emprego com a porcentagem mais clara e viu ela ser preenchida pelas pessoas de tonalidade mais clara ou branca? Será que essas pessoas perceberam que já foram escolhidas ou rejeitadas pelo mesmo motivo? Será que sabem das vantagens e desvantagens que têm dentro da nossa sociedade?
Aqui no Brasil esse assunto ainda é muito polêmico e, na maioria das vezes, mal entendido por uma grande parcela da população. É necessário compreender as nossas raízes históricas para que possamos nos entender e perceber como indivíduos dentro dessa sociedade, entendendo nossos direitos e respeitando os direitos das pessoas que estão dentro dessa dicotomia. Segundo a advogada e pesquisadora Alessandra Devulsky o colorismo é o braço articulado do racismo, e ela afirma também que o racismo tem nuances na forma como se desenvolve, de acordo com a sociedade, a cultura a qual adere, na qual é construído. Para ela, o colorismo é um conceito, uma categoria, uma prática, mas sobretudo uma ideologia na qual hierarquizamos as pessoas pretas de acordo com o fenótipo que têm: aproximado ou distanciado da africanidade, próximo ou distante da europeidade.
Será que falando bonitinho assim conseguimos entender exatamente o que causa e de onde vem essa segregação miscigena? Difícil. Cada pessoa, dentro de sua própria tonalidade, trará sua vivência pessoal e terá classificações e definições muito singulares, mas ao observar o cenário de forma mais ampla, conseguiremos notar que há de fato um teor segregador nisso tudo. É preciso ter muito cuidado, pois como falei anteriormente, tudo isso se trata de nossas vivências e experiências dentro do nosso convívio com o racismo, e tratar dessa divisão de forma muito incisiva pode revelar traumas que causarão inúmeras rachaduras em nosso posicionamento racial.
Em resumo, o ser humano preto não está livre do racismo, por mais que estejamos dentro de diferentes paletas e que aparentemente essas diferenças nos coloquem em lugares e/ou posições diferentes dentro da comunidade. É preciso continuar tendo cuidado com a nossa auto declaração, respeitar o tempo de entendimento do próximo, continuar combatendo o racismo e estar apto a perceber que nossa tonalidade nos oferece ocasionais oportunidades de visibilidade e aceitação (ou não) de acordo com o padrão europeu. Não podemos transferir mais conflitos para a nossa comunidade para que não carreguemos mais um peso e responsabilidade de algo que não é nosso, o racismo não é nosso, nunca foi e nunca será. ‘Eles’ sequestraram a nossa origem e não podem ter em suas mãos a decisão de quem é preto ou não, os nossos traumas protagonizados não sociedade não podem ser debatidos por nenhum deles também, por isso, vamos nos conhecer, saber de onde viemos, e nos respeitar para que possamos respeitar a história das outras pessoas pretas independente da sua tonalidade e dentro do contexto de cada uma.
Referências:
WALKER, Alice. If The Present Looks Like The Past, What Does The Future Look Like? Heresis Collective. New York, 1982
VIEIRA, João. Comunidade negra debate colorismo e expõe traumas causados pelo mito da democracia racial. Disponível em: <https://www.hypeness.com.br/2018/08/comunidade-negra-debate-colorismo-e-expoe-traumas-causados-pelo-mito-da-democracia-racial/> Acesso em 29 nov 2021.
DE MARTIN, Roberto. ‘O colorismo é o braço articulado do racismo’ Disponível em: <https://www.cartacapital.com.br/entrevistas/o-colorismo-e-o-braco-articulado-do-racismo/> Acesso em 29 nov 2021
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